Por: Prof. Paulo Fernando Melo
Natalício Tenório Cavalcanti de Albuquerque nasceu em Palmeira dos Índios (AL), em 1906, órfão de pai aos 12 anos, viu-se obrigado a trabalhar no campo para contribuir para o sustento da mãe e dos irmãos.
Em 1928, mudou-se para o Rio de Janeiro e no ano seguinte foi administrar uma fazenda em Duque de Caxias (RJ) cujo proprietário era cunhado de Otávio Mangabeira, então ministro das Relações. Logo ganhou fama de bom pistoleiro valente na região, tendo se envolvido em contendas armadas com saldo habitual de mortes e feridos e viu prosperar, assim, sua fama de pistoleiro de boa pontaria.
Forneceu uma tropa de mulas para os rebeldes constitucionalistas de São Paulo em 1932.
Em 1936 elegeu-se vereador oposicionista pela União Progressista Fluminense em Nova Iguaçu, representando o então distrito de Duque de Caxias.
Foi protagonista de inúmeros tiroteios sendo preso algumas vezes e conta a lenda que tinha mais de 40 marcas de balas em seu corpo a quem atribuía aos pistoleiros do Senador Amaral Peixoto que depois foi governador do Rio de Janeiro
Com fim da ditadura Vargas, filiou-se a União Democrática Nacional (UDN) e em 1947 foi eleito deputado estadual constituinte, e em outubro de 1950 elegeu-se deputado Federal com grande votação, e foi combatente a Getúlio Vargas e ao Governador Amaral Peixoto.
“A Revista ‘O Cruzeiro” na edição de 14/10/1950, na página 71, reproduz a fala de Tenório:
“Prender, não me prenderão porque amarrado eu não vou. Matar, não me matarão, porque não são Nosso Senhor. Só morro, no dia certo, na hora que Deus marcar”.
Morava numa casa fortificada conhecida por “fortaleza” em Caxias (RJ), envolveu-se em vários incidentes incluindo o assassinato do delegado de polícia de Duque de Caxias, Albino Martins de Sousa Imparato, em 1953.
Segundo o escritor Carlos Heitor Cony: ”A Fortaleza de Tenório era fantástica para o tempo e para as finalidades. Possuía sistemas blindados de segurança. Porões de oxigênio próprio para o caso de um ataque atômico […]. o dia que tivermos uma memória nacional, a casa/fortaleza em Caxias, será um santuário político.”.
Tenório cursou Direito na Faculdade Nacional de Direito, do Rio, e atuou como advogado criminalista em diversas causas polêmicas.
Em 1954, fundou no Rio, com Hugo Baldessarini, o diário “Luta Democrática” com linguagem popular, sensacionalista, com fotos de crimes bárbaros, com preço módico e sempre em campanha anti-getulista. Aliou-se, nesse sentido, ao jornalista Carlos Lacerda e, nessa época, consolidou sua marca registrada com uma capa preta sempre acompanhada de uma metralhadora apelidada de ‘Lurdinha – uma arma de uso militar que foi apreendida pelo Exército. Desde então, “Lurdinha” está no Museu do Batalhão de Guardas, no Rio.
Em relação a esse curioso apelido, conta-se que os pracinhas deram o nome, a princípio, à temida metralhadora alemã Maschinengewehr 42- MG42, devida a rápida cadência de tiros. Outra versão seria o nome da namorada de um soldado que era muito falante, de modo muitos atribuíam a semelhança ao barulho de uma máquina de costura.
Em outubro de 1954 foi reeleito Deputado Federal pela UDN com 42.060 o mais votado do estado do Rio de Janeiro.
Fez oposição à mudança da capital para Brasília e manteve-se na oposição ao governo JK denunciando inúmeros casos de corrupção.
Em 1958, por ocasião das enchentes que assolaram o município, distribuiu terras aos flagelados e auxiliou-os na construção de novas casas.
No pleito de outubro de 1958, foi novamente reconduzido à Câmara com a maior votação do estado (46.029 votos).
Em 1960 rompeu com Carlos Lacerda e candidatou-se a governador do Rio pelo Partido Social Trabalhista (PST) ficando em terceiro lugar com 23% dos votos válidos, resultado decisivo para propiciar a vitória do udenista Carlos Lacerda, que derrotou por pouco mais de 20 mil votos o petebista getulista Sérgio Magalhães.
Em outubro de 1962, Tenório foi derrotado novamente no pleito para o governo do estado do Rio. Apoiado pela coalizão do PST com o Partido Trabalhista Nacional (PTN), adotou um viés populista esquerdista com bandeiras de João Goulart e do deputado Leonel Brizolla.
Na Câmara, Tenório se manteve na liderança do PST, tornando-se líder do bloco dos pequenos partidos. O seu jornal apoiou o comício de 13 de março de 1964 promovido pelas forças esquerdistas e, na noite de 31 de março de 1964, Tenório dirigiu-se ao Palácio Laranjeiras, onde se encontrava o presidente João Goulart. Depois disso, teve o seu mandato de deputado federal cassado.
Nos anais da Câmara dos Deputados ficou registrado na edição de maio/junho 1964, vol. 8, página 577 a transcrição do discurso do Dep.Tenório:
“Estou envergonhado de que a revolução apure que eu matei só um. Matei mais, confesso. Matei, Srs. Deputados,porque fui obrigado a fazê-lo, como, em autodefesa, a sociedade é obrigada á matar o cão danado, a cobra venenosa. A sociedade não exige que o homem corra diante do agressor. Bendita a sociedade que tem alguém capaz de usar a coragem, a vida em defesa dela, em cujo meio vive.”
Recolhido em Duque de Caxias atuou em obras filantrópicas, como a Fundação São José – que mantinha um conjunto habitacional com cerca de dez mil pessoas com aluguéis baratos – e o Colégio Maria Tenório com cinco mil crianças e vários cursos profissionalizantes. O seu jornal A Luta Democrática caiu em declínio e foi editado até o início dos anos 80.
Ajudou a eleger seu genro, Hydekel Freitas Lima, deputado federal pelo estado do Rio na legenda governista da Aliança Renovadora Nacional (Arena) entre 1975 e 1982 e, mais tarde, senador entre 1990 e 1995. Em novembro de 1978, participou de uma recepção ao então presidente eleito João Batista de Oliveira Figueiredo, em visita a Duque de Caxias.
Em janeiro de 1979, retornou as manchetes ao assumir a defesa do ex-policial Mariel Mariscot, acusado de ser integrante do “esquadrão da morte”. Em dezembro do mesmo ano, manifestou a intenção de voltar à atividade política em defesa do presidente Figueiredo, que considerava “a última solução para o país”.
No pleito de novembro de 1986 apoiou a candidatura de seu neto Fábio Tenório, que concorreu a uma cadeira na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro pela legenda do Partido Democrático Trabalhista (PDT), mas não se elegeu.
Segundo o jornalista Sebastião Nery, no seu livro Folclore Político retratou o lado pitoresco do Deputado Tenório:
Em 1961, na Câmara, o deputado Tenório Cavalcanti, colega do Dep. ACM da Bahia atacava o ex-ministro da Educação de Dutra e ministro da Fazenda de Jânio Quadros, o baiano Clemente Mariani, dono do Banco da Bahia. ACM o aparteou:
– V. Excia pode dizer o que quiser, mas na verdade o que V. Excia é mesmo é um protetor do jogo e do lenocínio, porque é um ladrão.
Tenório sacou um revolver:
– Vai morrer agora mesmo!
– Atira!
Nem Tenório atirou nem Antonio Carlos morreu.
Tenório encontrou-se na Avenida Rio Branco com o ex-prefeito Mendes de Morais.
-Como vai você, Tenório?
– Fazendo meu jornal, A Luta Democrática.
-Não leio o seu jornal só publica fotografia de cadáver na primeira página.
-Marechal, não se faz jornal sem dinheiro. Meu jornal vive da venda avulsa. E quem vende meu jornal é cadáver na primeira página.
-Mas há uma forma de mudar isso, de arranjar outra orientação?
-Há, sim. O Sr. me arranja o dinheiro para manter o jornal e eu publico a sua fotografia no lugar dos cadáveres.
Foi saindo, voltou-se.
-O que vem dar na mesma. Mais ou menos a mesma coisa.
É considerado o “avô” das milícias, faleceu no Leblon no Rio de Janeiro no dia 5 de maio de 1987 longe da sua baixada fluminense. Foi homenageado com nome de rua em Nova Iguaçu(RJ), Duque de Caxias(RJ), Macaé (RJ),São Paulo(SP), Curitiba (PR) e Abreu e Lima (PE).
- Em 1984 foi publicado o livro Tenório, o homem e o mito, de autoria de sua filha Maria do Carmo Fortes. Em 1986 foram lançadas mais duas obras sobre sua vida: O homem da capa preta, filme de Sérgio Resende, e o livro Capa Preta e Lurdinha, de Israel Beloch